Os motivos por trás da enfatização das expressões políticas “Fora Temer” e “Volta Dilma” durante o 44º Festival de Cinema de Gramado
Durante um evento que proporciona muitos encontros profissionais, com pessoas de todo o Brasil e do mundo, o Festival de Cinema de Gramado, localizado na serra gaúcha e sediado no Palácio dos Festivais - no centro da pequena e aconchegante cidade – ocorreram constantes manifestações dos realizadores de filmes nacionais, concorrentes ou não. Não é a toa que ao longo das apresentações dos filmes, além deles mesmos, também chamou atenção a exposição e reiteração de um discurso contrário ao processo político atualmente em andamento no país, através dos bordões “Fora Temer” e “Volta Dilma”.
Curtametragistas que ganharam os Prêmios Assembléia Legislativa e RBS no evento./Foto: Edison Vara |
Esse pessoal do audiovisual demonstrou suas preocupações, com os investimentos econômicos na sua área de trabalho e também com os rumos políticos que podem gerar a perda de algumas conquistas. Programas como o Pronatec, o Minha Casa Minha Vida, o Mais Médicos e o Ciência sem Fronteiras foram bastante reduzidos, em proporções distintas em cada um.
Segundo o Ministério do Planejamento, a educação (Pronatec e Ciências Sem Fronteiras) teve uma redução de 10,8% (R$ 5,48 bilhões a menos em valores constantes). E o corte para os Principais Programas Sociais foi de -14%. A cultura teve quase o mesmo valor reduzido (-13,8%). Segundo os números apresentados pelo governo ao Congresso, haverá uma redução de 7,4% no programa “Inclusão Social por meio do Bolsa Família”, do Cadastro Único e da articulação de políticas sociais. Isso vem em paralelo com propostas de fixação dos investimentos sociais a longo prazo (o que impede, por exemplo, um governo futuro de retomar esses investimentos em grande escala).
A apresentadora, Marla Martins, o diretor Roberto Burd, o apresentador Leonardo Machado e o diretor Davi de Oliveira Pinheiro lendo o discurso em público./Foto: Mariana Catalane. |
O produtor e diretor Frederico Mendina compartilha do posicionamento dos colegas de profissão e visualiza uma saída para a economia do audiovisual: “O cinema brasileiro tem que ser internacionalizado”, ação que, pelo visto, está em andamento. Além dos americanos Thevor Groth, diretor da programação do Festival de Sundance, e de Patrick Conolly, diretor das aquisições do Sundance Channel Global, um grupo de nigerianos chegou ao festival - dois cineastas, acompanhados de seu “embasador”, cargo equivalente a advogado legal, aqui no Brasil.
Leo Omossebi (39), Olomuywa (41), Olujumobi (42)./Foto: Pietro Pasqualotti |
Manifestação na cerimônia de premiação do melhor curta metragem. /Foto: Edison Vara |
Esses são alguns acontecimentos que a entrevista abaixo, feita com Pedro Guindani, coordenador do Colegiado Setorial do audiovisual do Rio Grande do Sul, tenta trazer à tona com as devidas explicações.
Como você avalia a manifestação dos realizadores na premiação da Mostra Gaúcha?
Em linhas gerais, foi uma manifestação da categoria como posicionamento político e abordagem que tem se dado ao questionamento vicioso e cretino quanto ao financiamento do estado à cultura.
O por quê do estado financiar a cultura?
É essencial que o estado se coloque como financiador e coparticipante da realização cultural, com o objetivo não apenas de desenvolver uma indústria
cultural a partir dessa atividade, mas também com o objetivo fundamental para constituição da nossa sociedade, de perpetuar e fundamentar a nossa identidade cultural.
E contra quem é o discurso?
Contra as mesmas fontes conservadoras que estão perpetuando o golpe atualmente. São forças com a intenção de silenciar as vozes de quem ousa questionar o processo político que estamos vivenciando.
Já é perceptível o alcance desse objetivo?
Mais importante que a visibilidade, é que quase todos os profissionais se posicionaram contra essa atual movimentação política. Isso é positivo, de fato, no sentido de que estamos alinhados no mesmo discurso. Foi uma ação enfática, forte e visível, de forma que não apenas os presentes tenham apoiado aposição, mas também realizadores de fora do estado tenham compartilhado desse posicionamento.
Qual o rumo econômico do cinema nacional?
Não sei. Espera-se que os atuais ocupantes do governo federal mantenham as políticas atualmente em vigor para o financiamento do audiovisual brasileiro, tendo em vista que a atividade tenha atingido uma repercussão e visibilidade inéditas ao longo dos últimos anos. É necessário que a Ancine mantenha sua autonomia e seu poder, diante das presentes circunstâncias e do futuro, para o qual o audiovisual deve estar estruturado, forte e presente.
Agradecimentos: Edison Vara, Festival de Cinema de Gramado, Leonardo Peixoto, Luísa Cecília da Silva Pinto, Mônica Catalane, Pedro Guindani e Pietro Pasqualotti.